terça-feira, 28 de agosto de 2012

Carta de Ana de Hollanda com reclamação do orçamento do MinC repercute mal no governo


BRASÍLIA — O governo não gostou nem um pouco da carta enviada pela ministra Ana de Hollanda (Cultura) para sua colega Miriam Belchior (Planejamento) reclamando de falta de recursos, como revelou o GLOBO nesta segunda-feira, em reportagem antecipada pelo vespertino para tablet “O Globo a Mais”. E muito menos gostou do vazamento da carta. Mais que isso, a iniciativa de Ana não deve ter o efeito esperado, pelo menos de imediato. O Ministério do Planejamento afirmou, por meio de sua assessoria de imprensa, que o corte no Orçamento da União de 2012, feito no início do ano, afetou todos os ministérios, e que a Cultura não vive uma situação excepcional. E que cabe aos gestores economizar e eleger prioridades
. ‘Gestão em risco’
A carta foi enviada no último dia 15, com dados sobre o orçamento do ministério. Nela, a ministra da Cultura afirma que “esses números colocam em risco a gestão e até mesmo a existência de boa parte das instituições culturais”. Por sua assessoria, Ana de Hollanda avisou que nem ela nem ninguém do ministério irá se pronunciar sobre o assunto.
No início do ano, o governo anunciou um corte de R$ 35 bilhões no Orçamento da União de 2012, dos quais R$ 25 bilhões eram de investimentos. A preocupação do Palácio do Planalto foi reforçar o discurso de austeridade fiscal diante da crise internacional. Os maiores cortes atingiram os ministérios da Saúde, Educação, Cidades e Defesa. No Ministério da Cultura o corte foi de quase 15%, representando cerca de R$ 130 milhões. Na época, a ministra manifestou esperança de recuperar esses recursos até o fim do ano, o que normalmente acontece com todas as pastas.
No Ministério do Planejamento a iniciativa de Ana de Hollanda causou irritação. Além de considerada precipitada, já que o governo costuma liberar o que foi cortado a partir de outubro, o comentário era que não é “usual” um ministro enviar carta reclamando de falta de recursos, e muito menos deixá-la vazar. E o Planejamento atribuiu as dificuldades no orçamento da Cultura à falta de jogo de cintura de seus gestores.
Mas Ana pode contar com apoio do Congresso. Integrante da Comissão de Educação e Cultura da Câmara, o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ) diz que está havendo uma redução constante das verbas orçamentárias para a área de Cultura e que ele tem sido procurado por servidores da pasta com reclamações dos baixos salários.
Segundo Alencar, assim como faziam os ex-ministros Gilberto Gil e Juca Ferreira, a ministra Ana de Hollanda deve dialogar mais com o Congresso para a destinação de mais verbas para sua pasta durante a tramitação e votação do orçamento — o governo encaminha sexta-feira a proposta para o ano de 2013.
— Está havendo uma involução das verbas para a área de Cultura. O Brasil é sempre colocado como país emergente, e nenhum país entra em um processo civilizatório se não valoriza seu acervo cultural. Os servidores da área têm me procurado para denunciar a defasagem salarial. Vamos ver como vem o orçamento para 2013, mas não tenho expectativa de acréscimo. Vamos assumir a bandeira por mais recursos para a Cultura. Nos sentimos signatários dessa carta — afirmou Chico Alencar. — Os ministros Gil e Juca dialogavam com o Congresso para obter mais verbas. Vamos retomar isso com a ministra Ana a partir da próxima semana, com o orçamento de 2013 já enviado.
O documento é uma das mais fortes críticas já feitas ao atual estado da Cultura no país e reverbera uma insatisfação de grande parte dos 2.667 servidores na ativa do MinC. Uma das principais preocupações é com as condições estruturais dos prédios ligados ao ministério. A Biblioteca Nacional, por exemplo, está com o ar-condicionado desligado desde abril, quando um acidente no sistema de refrigeração afetou o acervo de periódicos. Os servidores também denunciam vazamentos no telhado, rachaduras nas paredes e instalações elétricas inadequadas.
Na carta, Ana de Hollanda também fez um alerta sobre a falta de um plano de carreira e os baixos salários. De acordo com ela, a taxa de evasão dos funcionários aprovados no último concurso público para o MinC foi, em média, de 53%: 55% dos funcionários diretamente vinculados ao ministério, 70% do Instituto Brasileiro de Museus, 40% da Funarte, 67% da Fundação Cultural Palmares, 37% da Fundação Biblioteca Nacional e 44% do Instituto do Patrimônio Histórico Artístico Nacional.